por Marlene Polito
Publicado em 28/01/2025, às 12h27
“A fotografia é a memória de todos nós. É através dela que o mundo nos vê.”
Recentemente, foi anunciada a nona exposição de Sebastião Salgado em Paris, a ser realizada entre os dias 23 de janeiro e 15 de março na Galérie Polka. A notícia é breve, mas chama atenção para um trabalho que há décadas mobiliza discussões sobre arte e humanidade.
Salgado é reconhecido por retratar a condição humana de modo marcante. Os enquadramentos cuidadosos, o respeito pela figura retratada e a força do preto e branco são elementos que caracterizam uma obra de vida, de toda a vida.
Em junho de 2024, o jornal americano The New York Times selecionou 25 imagens que definiriam os tempos modernos, incluindo uma fotografia de Salgado. Os sinais de cansaço de um trabalhador, o olhar de um imigrante ou a vastidão de uma paisagem pouco habitada são registros que traduzem questões contemporâneas de forma contundente. Suas fotos parecem ultrapassar o instante capturado, convidando-nos a refletir sobre as histórias e realidades ali presentes.
Imagem: Reprodução - Crianças, da série “Êxodos”
“A minha fotografia é como uma carta que escrevo para o resto do mundo.”
Em cada criança, o olhar tem uma expressividade particular e desperta um sentimento distinto: ao centro, a criança tem olhos de espanto; na do lado direito, os olhos estão cansados, há pura exaustão; e na da direita, eles espreitam e tem um quê de interrogação.
Um pouco sobre Sebastião Salgado
Como economista de formação, Salgado iniciou sua carreira em um caminho bem diferente daquele que acabaria abraçando. Contudo, sua sensibilidade desde cedo já parecia apontar para uma missão maior: documentar a humanidade em suas contradições e, principalmente, em sua dignidade.
Em séries como Trabalhadores (Workers) e Êxodos (Exodus), ele nos revelou um Brasil profundo e também um mundo marcado pela desigualdade. Suas lentes, porém, não apenas escancararam problemas sociais: elas lançaram luz sobre a força e a esperança que emergem dos lugares mais sombrios.
Imagem: Reprodução / Capa do livro “Trabalhadores: uma arqueologia da Era Industrial” (1996), da série “Workers”
“Com a fotografia, documentamos nossa história e aproximamos as pessoas dos grandes temas humanitários.”
A obra Trabalhadores se tornou emblemática ao mostrar o cotidiano e os esforços de homens e mulheres em diferentes partes do mundo.
Imagem: Reprodução - Mineradores em Serra Pelada, da série “Gold”
“Cada imagem que capto é um testemunho de nosso tempo, e nos convida a refletir sobre o mundo ao nosso redor.”
A chamada “Mina de Ouro Serra Pelada” tornou-se um verdadeiro Eldorado brasileiro no imaginário popular. Salgado registrou as condições extremas dos garimpeiros que arriscavam tudo em busca do metal precioso.
Imagem: Reprodução - Cena da floresta, da série “Amazônia”
“Meu trabalho não busca apenas mostrar a realidade, mas também provocar empatia e compreensão.”
Sebastião Salgado soube transformar paisagens e rostos brasileiros em narrativas universais, salientando questões que, por muito tempo, ficaram à margem. Olhares de povos indígenas, condições precárias de trabalho no campo, grandes deslocamentos de pessoas em busca de oportunidades – cada cena de sua obra apresenta uma parte do nosso retrato coletivo.
Uma reflexão só nossa
Pela força das imagens e pelo poder transformador da arte aliada ao compromisso humanitário, Salgado nos prova, a cada nova exposição, que a beleza e a empatia podem florescer mesmo nos cenários mais inóspitos. Ele nos lembra, com suas imagens, que toda vida é preciosa e que, às vezes, basta um olhar para redescobrir o que, no fundo, sempre esteve ali.
Marlene Theodoro Polito é doutora em artes pela UNICAMP e mestre em Comunicação pela Cásper Líbero. Integra o corpo docente nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão Corporativa e Gestão de Comunicação e Marketing na ECA-USP. É autora das obras “A era do eu S.A.” (finalista do prêmio Jabuti) e “O enigma de Sofia”. [email protected]
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