Por mais que a oposição esperneasse, vários órgãos de imprensa já haviam antecipado o resultado
Reinaldo Polito Publicado em 15/12/2023, às 12h32
Flávio Dino foi aprovado com folga na sabatina que o elegeu para o cargo de ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). Na verdade, tratou-se de uma goleada com 47 votos a favor e 31 contrários. Não foi surpresa. Por mais que a oposição esperneasse, vários órgãos de imprensa já haviam antecipado o resultado. Acertaram na mosca.
Assim que o placar foi divulgado, começou a chiadeira: “ah, não existe oposição neste país”, “é o fim do Brasil, não temos mais salvação”. Será que essas pessoas aguardavam resultado diverso? Se a expectativa era outra, só poderiam ter buscado informação em blogs e sites que distorceram a realidade.
Vamos nos esquecer das exceções, aqueles dois ou três casos que acabam por contrariar as expectativas. Afora esses, que mesmo isolados chegaram a ser previsíveis, alguém esperava que os governistas votariam contra e os oposicionistas a favor?
A vitória é da maioria
Um fato que precisa estar presente em qualquer análise é que a oposição não possui maioria no Senado. Isso não significa que não haja oposição no país, mas sim que os opositores são minoria. Ora, se os governistas possuem número maior, não haveria chance de perderem essa disputa. Ou será que alguém imaginou, ingenuamente, que os votos seriam dados a partir das respostas do sabatinado?!
A avaliação do pretendente ao cargo não é feita apenas levando em conta o seu notável saber jurídico e a sua reputação ilibada, são considerados também, e quase sempre, principalmente, o envolvimento político do candidato.
Conversa de bastidores
Lula armou a tropa com a artilharia que dispunha para que o seu indicado conquistasse a vaga. Exonerou ministros como Welligton Dias, Carlos Fávaro, Camilo Santana e Renan filho para que ocupassem suas cadeiras no Senado e assim pudessem votar. Liberou R$ 10 bi em emendas parlamentares em apenas dois dias. Ou seja, foi de corpo e alma nesse ringue.
Como o resultado já estava praticamente definido, a sabatina foi mais para cumprir tabela. Dino fez a tarefa de casa. Embora goste de aparecer na mídia, trabalhou fora dos holofotes. As grandes propostas, os projetos mais relevantes não são aprovados com os argumentos usados durante a sua apresentação. Não, essas negociações são feitas nos bastidores, nas conversas de coxia, no pé da escada, nos corredores e nos gabinetes.
Preparo e negociações
Nesses diálogos preliminares as partes defendem seu ponto de vista e seus interesses. Cedem aqui, reivindicam ali, modificam acolá, tudo para azeitar o discurso e deixá-lo de acordo com a vontade do freguês. No momento da reunião com o grupo que irá analisar os detalhes do projeto, a decisão já foi tomada. Fazem um ou outro acerto, mas nada que modifique substancialmente o que já havia sido acordado.
Dino foi para a sabatina sabendo quais seriam as questões que precisaria responder. Tinha consciência de que assim como os governistas se desdobrariam em salamaleques, os opositores usariam palavras duras e fariam acusações ferozes. Para cada argumento contrário, tinha a palavra ajustada. Por isso, pôde se comportar com serenidade, pois nada do que os senadores levantaram ao longo das 11 horas de questionamento foi motivo de surpresa. Faz parte do jogo.
Desânimo
Há um desânimo nos oposicionistas por causa da derrota. O pessoal se esquece de que quem está no poder e tem maioria na base de sustentação política dá as cartas e dirige as decisões para o rumo de suas conveniências. Nada mudou na história política da humanidade.
Por mais impossível que possa parecer agora, é importante ter consciência de que nenhuma situação é imutável. Às vezes demora um pouco mais de tempo, mas haverá o dia em que novas forças políticas tomarão o poder. Passado outro período, mais mudanças ocorrerão. Até nas mais ferrenhas ditaduras há alternâncias. Quem imaginava, por exemplo, que um dia o muro de Berlim seria derrubado?
Muitos exemplos
Nem precisamos ir tão longe. O exemplo da Argentina, com Milei derrotando o peronismo, acabou de acontecer. Aqui no Brasil, quando os militares estavam no comando do país, segurando o poder com unhas e dentes, poucos eram aqueles que ousavam partir para o confronto. Sem que um único tiro fosse disparado, aceitaram voltar para a caserna.
Foram criticados, xingados, chamados de torturadores, ditadores, autoritários. Ouviram em silêncio todos os adjetivos que lhes impuseram e em nenhum instante voltaram a usar a força para calar os detratores. Aqueles que haviam sido exilados puderam voltar e readquirir os direitos políticos. Muitos se candidataram e venceram eleições.
Alternância de poder
Assim é a vida. Ainda que os ministros do STF, pelo menos por enquanto, tenham funções vitalícias, um dia terão de deixar o cargo, como aconteceu recentemente com Lewandowski e Rosa Weber. Outros virão. E dependendo de quem esteja no poder, a indicação penderá para o espectro ideológico mais alinhado com sua posição.
Desta forma, quem estiver revoltado com a aprovação de Flávio Dino, sempre terá a oportunidade de arregaçar as mangas e começar a trabalhar para eleger os candidatos em 2024 e 2026. Essa é a arma mais poderosa que a população tem ao seu dispor para atingir seus objetivos. Quem sabe assim, com conversas de bastidores e maturidade nas negociações políticas, a história em breve possa ser contada com outras palavras.
Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de Oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão de Marketing e Comunicação, Gestão Corporativa e MBA em Gestão de Marketing e Comunicação na ECA-USP. Escreveu 34 livros, com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram: @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no https://reinaldopolito.com.br/home/