Seus aliados precisam fazer contorcionismos para explicar o que nem sempre pode ser explicado
Reinaldo Polito Publicado em 16/02/2024, às 15h31
Lula sempre foi bom de improviso. De uns tempos para cá, entretanto, não tem sido muito feliz ao se valer desse recurso da oratória. Na maioria das vezes, por não ter preparado o que iria dizer, acaba por falar o que não deveria. Depois, seus aliados precisam fazer contorcionismos para explicar o que nem sempre pode ser explicado.
Em certos casos, seus “porta-vozes” recorrem a verdadeiro “triplo carpado twist” para interpretar os seus discursos por outros ângulos. Quase nunca dá certo. Fica evidente que a intenção é o de minimizar os estragos provocados por seus pronunciamentos. Por isso, em eventos mais cerimoniosos, provavelmente aconselhado por seus assessores, passou a ler as mensagens previamente elaboradas.
A leitura evita deslizes
Embora chegue a perder um pouco do brilho das falas instantâneas, o resultado tem sido positivo. Há situações em que faz uma associação com leitura e improvisação. Esses tem sido seus melhores desempenhos. Lê determinada frase e em seguida faz rápidos comentários sobre o tema. Dessa forma, não se perde na sequência das ideias e evita as gafes.
Durante sua passagem pelo Egito, fez pronunciamentos que “pareceram” ser improvisados. Sim “deram a impressão” de improvisação porque esse tipo de discurso deve ter sido exaustivamente pensado e treinado antes de ser proferido. Seu olhar fixo, como se procurasse algo nas profundezas da mente, é uma demonstração clara de que tentava se lembrar do que havia exercitado.
Nessas circunstâncias, em que haverá enorme repercussão mundial, o dirigente de um país não pode correr riscos. Dessa forma, os ataques que desfere contra Israel não devem ser creditados a algum engano de palanque, mas sim tomados como fruto de sua ideologia contrária ao pensamento e a ações israelenses. Portanto, a mensagem boa ou má foi propositalmente planejada da forma como se expressou.
Houve progresso
Tendo sido “meio decorado” ou não, é visível o cuidado de Lula com a linguagem utilizada. Exceto quando fala com plateias formadas por seus seguidores, momentos em que, tudo leva a crer, propositalmente comete toda sorte de deslizes gramaticais, o presidente tem caprichado mais.
Ele mesmo, em tom de brincadeira, disse certa vez que já havia melhorado muito a sua linguagem, pois não falava mais “menas” nem “meia”. Com essa autogozação, tira das costas o peso de ter de se expressar sem equívocos gramaticais.
Essa sempre foi uma preocupação do petista. Poucos sabem que houve época em que procurou se aperfeiçoar com o estudo da Língua Portuguesa. Como
curiosidade, resolvi bisbilhotar o seu passado para ver os cuidados que já havia tomado para se aprimorar.
O sigilo do aprendizado
Quando uma personalidade relevante frequenta um curso, poucos ficam sabendo. Preferem ficar no anonimato. Não é diferente com o meu curso de oratória. Alguns insistem em contratar o treinamento com cláusulas de sigilo. São esses, todavia, os que mais acabam por indicar outros alunos para mim.
Apesar dessa dificuldade, consegui descobrir que Lula foi em busca de um curso de Português, mas acabou desistindo antes mesmo de começar. Em entrevista às Páginas Amarelas da Veja, em 1993, o filólogo e um dos mais importantes autores e professores de Português, Napoleão Mendes de Almeida, autor da famosa “Gramática Metódica da Língua Portuguesa”, confidenciou que Lula tentou ser seu aluno.
Chegou na porta e não entrou
Fez a matrícula no seu curso por correspondência, mas não devolveu a primeira lição escrita preenchida nem efetuou o pagamento da mensalidade. Mostrou interesse, mas sumiu antes de sequer ter iniciado.
Se tivesse continuado de maneira disciplinada com as aulas do Mestre Napoleão, com certeza, hoje seus discursos teriam outra qualidade. Principalmente nas falas de improviso, mas, de improviso mesmo, quando é obrigado a construir a sequência do discurso já diante da plateia. Não cometeria os erros gramaticais que comete, daria sequência lógica à mensagem e, mais importante, evitaria se apresentar com os defeitos que tem mostrado.
Nunca é tarde demais
Ainda há tempo. Nenhuma pessoa é velha demais para aprender. Talvez até tenha tomado algumas aulas. Essa informação seria reservada, trancafiada dentro de segredos que não ultrapassariam as fronteiras do Palácio do Planalto. Será possível notar apenas o resultado. Também, pelo fato de ser bom observador, preste atenção naqueles intelectuais que o cercam e aprenda com eles, assim “de ouvido”.
Quem exerce funções de liderança, a exemplo de um presidente da República, deve saber que sua imagem será avaliada também pela forma como se manifesta em seus discursos.
Avaliação também pela oratória
Quem não conjuga bem os verbos, não respeita as concordâncias e comete toda sorte de deslizes gramaticais, pode passar a imagem de alguém despreparado. Ora, se é despreparado, não possui autoridade. E, se não tem autoridade, não pode ser confiável.
Lula já encontrou seu caminho e conseguiu corrigir muitos de seus defeitos. Um pouco de dedicação ao estudo da nossa língua poderia tornar sua comunicação ainda mais eficiente. Não dizer “menos” nem “meia” é importante, porém, muito pouco para alguém que preside um pais.
Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de Oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão de Marketing e Comunicação, Gestão Corporativa e MBA em Gestão de Marketing e Comunicação na ECA-USP. Escreveu 35 livros, com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram: @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no https://reinaldopolito.com.br/home/
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