Cultura

Não existe ouvinte desinteressado, mas sim orador desinteressante

Quem fala em público tem à sua disposição todos os recursos de que precisa para manter uma plateia atenta

Já vi palestrante reclamar do público. Um deles, indignado, disse que a assistência parecia estar dopada, pois não reagia às suas provocações - Imagem: Freepik
Já vi palestrante reclamar do público. Um deles, indignado, disse que a assistência parecia estar dopada, pois não reagia às suas provocações - Imagem: Freepik
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 12/07/2024, às 14h33


Você já notou como algumas palestras são memoráveis, enquanto outras chegam a provocar sono na plateia? O segredo está no desempenho do orador. Veja como nós, Cesar Romão e eu, estamos nos preparando para um dos maiores desafios da nossa carreira.

Certa vez, ouvi um professor reclamando que seus alunos não tinham vontade de aprender, pois demonstravam desinteresse pelas aulas que ministrava. Eram originários dos mais diferentes cantos do país. Alguns chegavam a viajar até dez horas para frequentar o curso. Isso me fez pensar: que tipo de erro o mestre estaria cometendo?

Pessoas que se submetiam a tal sacrifício só não se envolveriam pelos ensinamentos se o professor não conseguisse motivá-las. Sim, porque estava nas mãos dele tornar aquelas aulas interessantes e atraentes.

Depende do orador

Quem fala em público tem à sua disposição todos os recursos de que precisa para manter uma plateia atenta. Se não lança mão deles, não pode culpar os ouvintes pela falta de atenção. Já vi palestrante reclamar do público. Um deles, indignado, disse que a assistência parecia estar dopada, pois não reagia às suas provocações.

Em seguida se apresentou outro orador. Em poucos minutos, era possível ouvir as gargalhadas da plateia. Era a prova de que o problema estava no palestrante anterior que não soube interagir com os ouvintes. Às vezes é preciso contar piadas ou casos interessantes. Em outros momentos há necessidade de fazer perguntas. Em casos extremos, até cantar, fazer imitações e sapatear.

Um grande desafio

O renomado palestrante Cesar Romão e eu enfrentaremos neste sábado, às 14h, um dos maiores desafios da oratória. Vamos proferir palestra para cerca de 300 pessoas no Espaço Ecovalle, em São Paulo. Até aí nada de anormal. O agravante é que será logo após uma feijoada.

Dá para imaginar esses ouvintes depois de terem degustado aquela comida pesada, provavelmente aproveitado as caipirinhas a que tiveram direito, assistindo a uma palestra. Sem contar que não estão ali com o objetivo principal de assistir a uma apresentação, mas sim comer uma boa feijoada.

As estratégias

O nosso plano de ação para tornar a apresentação bem-sucedida pode ser utilizado não apenas em palestras, mas também nas mais diversas circunstâncias, como reuniões de empresa, contatos sociais e condução de eventos.

Segurar a atenção dessa turma por cerca de uma hora exigirá muito jogo de cintura. A primeira atitude será evitar a tentação de “dar aulinha”. Em ambientes como esse, é preciso o tempo todo entreter os ouvintes com boa dose de espetáculo.

Teremos de nos apresentar contando histórias curiosas e explorando a presença de espírito, principalmente usando informações nascidas do próprio ambiente. Esse tipo de iniciativa provoca forte interação com o público. Por sinal, esse deve ser um procedimento de quem ministra palestras – proporcionar uma espécie de entretenimento para a plateia.

Uma das nossas estratégias para segurar a concentração dos ouvintes será a alternância da nossa presença no palco. Dessa forma, poderemos quebrar os possíveis focos viciados de atenção que se formam com frequência.

Assim que os ouvintes começarem a se cansar da minha presença, entra o Romão, e vice-versa. Dessa maneira teremos condições de manter a concentração do público por tempo mais prolongado.

Precisaremos nos movimentar bastante no palco, indo de um lado para o outro para renovar constantemente o interesse das pessoas. O “espetáculo” também exige alternâncias constantes no volume da voz e na velocidade da fala, com a finalidade de imprimir um ritmo instigante e motivador.

Cada caso é um caso

Cada apresentação possui suas peculiaridades. São experiências únicas. Embora já tenhamos em mente qual será a mensagem a transmitir, sabemos que ler a reação da plateia é fundamental para o sucesso do orador. Se a abordagem inicial não funcionar, precisaremos recorrer a um plano alternativo. Em certos casos, mais de uma mudança é necessária para acertar a sintonia com os ouvintes.

Por isso, a oratória é fascinante. Cada caso é um caso. Observar o comportamento do público e interpretar em que momento será preciso tomar um rumo diferente do planejado, faz com que a adrenalina mexa com o organismo e exija da mente a busca de saídas para essas situações.

Vale a experiência

Vamos nos dedicar para que tudo dê certo. Com mais de 40 anos de estrada enfrentando os mais diversos tipos de plateias, sabemos que em eventos dessa natureza, o palestrante deve se valer de todo conhecimento, energia e capacidade de adaptação para obter um bom resultado.

Lembre-se de que as palestras podem ser excelentes oportunidades para projetar uma imagem profissional positiva e contribuir para o crescimento da carreira. Com os cuidados necessários, é possível transformar um desafio em uma chance de sucesso. Tudo depende de empenho, disciplina, estudo e atenção. Afinal, não existe ouvinte desinteressado, mas sim orador desinteressante.

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