Comunicação

Os segredos da oratória de Lula e de Bolsonaro

A maioria das pessoas não consegue se distanciar de seu envolvimento político para analisar imparcialmente os méritos e falhas dos líderes que admiram

Há um fenômeno em comunicação denominado audição seletiva - Imagem: Redes sociais
Há um fenômeno em comunicação denominado audição seletiva - Imagem: Redes sociais
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 21/06/2024, às 17h31


Lula fala mal. Bolsonaro é um péssimo orador. Muita gente concordaria com essas afirmações. Lula é um sedutor de plateias. Bolsonaro é um encantador de serpentes. Talvez o mesmo número de pessoas chancelaria essas opiniões. Ou seja, independentemente da qualidade oratória de cada um, nessa avaliação, quase sempre, influencia mais o viés ideológico.

As críticas feitas à comunicação de Lula

O primeiro ponto negativo na comunicação do presidente é a sua voz desagradável, arrastada, às vezes até incompreensível. Na sequência, são apontados os erros gramaticais. Ainda que tenha melhorado um pouco, há momentos em que seus deslizes são primários.

Outro motivo de censura, principalmente depois de ter chegado à presidência pela terceira vez, são suas ideias ultrapassadas, antiquadas, divorciadas da realidade atual do país.

Embora a eloquência seja sempre bem-vinda, ainda mais quando se trata de um político, quem não gosta dos seus pronunciamentos diz que ele mais grita do que fala em seus discursos. Não são poucos também aqueles que se incomodam com suas repetições viciosas, como o constante uso do "sabe?" no final das frases.

Nos últimos tempos, uma de suas grandes virtudes no passado, que era a fala de improviso, se transformou em verdadeiro pesadelo para seus aliados. Com frequência, precisam sair em socorro do chefe para explicar que o que ele disse de improviso foi apenas uma gafe irrelevante. Algumas são até bem graves.

As críticas à comunicação de Bolsonaro

Os detratores de Bolsonaro criticam sua linguagem vulgar e seu uso frequente de palavrões e piadas inapropriadas. Ele mesmo se deu conta dessa fala inadequada, tanto que no final da campanha eleitoral pediu desculpas às mulheres, caso elas tivessem se sentido agredidas com sua maneira de se expressar.

Reclamam que ele repete constantemente as mesmas informações e finaliza várias frases com o irritante "talkey?". Seus arroubos intempestivos, quando estava na presidência, talvez tenham se constituído em seu ponto mais vulnerável.

Diante de públicos numerosos, como nos comícios na Av. Paulista e em Brasília, fazia promessas e ameaças, dando a entender que não toleraria mais a interferência de outros poderes no Executivo, mas depois, sentindo que não poderiam ser cumpridas, desconversava. Essa atitude decepcionou até parte de seus eleitores.

É possível acrescentar outra característica negativa. Faz pausas sem sentido antes de completar o raciocínio. Essas interrupções, mesmo sendo rápidas, podem se transformar em ruídos que comprometem o acompanhamento do discurso.

As qualidades na comunicação de Lula

Os seguidores de Lula não se cansam de destacar sua simpatia, inteligência e eloquência. Dizem que ele tem muita facilidade para se conectar emocionalmente com as plateias, adaptando o conteúdo de seus discursos às circunstâncias. Sua habilidade em fazer referências aos fatos e às pessoas presentes no instante em que se apresenta dá à sua mensagem a ideia de atualidade e pertinência.

As qualidades na comunicação de Bolsonaro

De acordo com os bolsonaristas, a maior qualidade do ex-presidente é a autenticidade. Afirmam que ele é transparente na pregação de suas ideias, baseadas quase sempre em quatro pontos: Deus, pátria, família e liberdade de expressão. Veem em suas brincadeiras a demonstração de leveza, bom-humor, presença de espírito e sinal de inteligência.

Apreciam sua competência para falar com desenvoltura nas lives, valendo-se de poucos apontamentos, por tempo prolongado. Admiram sua disciplina e empenho para aprender e se aprimorar. Houve extraordinária melhora em sua comunicação do momento em que chegou ao Palácio do Planalto até o final do mandato.

Por exemplo, uma de suas maiores dificuldades era a de se apresentar com a ajuda do teleprompter. Foi determinado a conseguir um bom desempenho em cada pronunciamento que fazia. Se não atingiu a perfeição, seu desenvolvimento foi visível.

Divergências nas Opiniões

A maioria das pessoas não consegue se distanciar de seu envolvimento político para analisar imparcialmente os méritos e falhas dos líderes que admiram. Há um fenômeno em comunicação denominado audição seletiva. É a tendência que temos para aceitar apenas o que nos seja conveniente e repudiar o que nos contraria.

Supondo que alguém não concorde com os comentários feitos sobre a comunicação de cada um dos dois políticos, porque julga que um ou outro fale muito mal, que tenha péssima oratória, o desafio que proponho é este: suba em um palanque e tente conquistar, como eles conquistaram, 60 milhões de votos.

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